Marcelo Ribas*
Empresas norte-americanas vêm se destacando na pesquisa e no desenvolvimento da chamada “carne de laboratório”, tendência que os especialistas explicam como sendo uma proteína desenvolvida a partir de células animais, sem a necessidade de abate nem a emissão de gases do efeito estufa em sua produção. No Brasil, a realidade mais próxima são as alternativas preparadas a partir de vegetais, como a proteína de ervilha, a proteína isolada de soja e do grão-de-bico, além da beterraba, que ajuda a imitar o sangue da carne.
Acredito que esteja claro que o objetivo não é só criar um alimento similar em gosto, aroma e textura aos produtos convencionais, mas também atender a uma nova demanda dos consumidores, preocupados com a redução do impacto ambiental da produção de carne e o bem-estar animal, bem como a uma mudança de hábito que contempla a redução da presença de proteína animal no cardápio.
A meu ver, essas transformações não significam que o fim da carne está próximo, mas é indiscutível que a pecuária e os produtores de carne vão precisar estar atentos às mudanças. É importante admitir que temos problemas e estabelecer um diálogo com a sociedade, com paciência, respeito e informação: o mundo não é preto no branco e apenas quando estivermos prontos para escutar duras ou infundadas críticas é que chegaremos a um novo produto, com selos e certificações que atendam aos anseios desses novos consumidores.
Apenas para gerar reflexão, a Fazenda Beef Passion é a primeira carne bovina do mundo a ser certificada como 100% sustentável pela Rainforest Alliance, que atesta a excelência socioambiental em todo o sistema de produção. Nela os animais são criados em uma espécie de “spa bovino”, onde – entre outras características – nos currais de engorda alto-falantes reproduzem música clássica e nebulizadores borrifam água para refrescar o gado. Talvez este tipo de manejo ainda não seja possível para todos os produtores, mas devemos nos inspirar em exemplos como este para criar outros sistemas de produção.
Por sua vez, a Intergado conta com tecnologias que atendem as exigências reivindicadas atualmente: desenvolvemos cochos e bebedouros eletrônicos que monitoram e detectam os animais mais eficientes da fazenda. No futuro, os animais selecionados a partir dos nossos dados demandarão menos área para pastejo e produção de alimentos, emitirão menos gases do efeito estufa e produzirão menos dejetos. Para os produtores comerciais de carne, nossos equipamentos permitem a certificação das propriedades rurais para o bem-estar animal, já que conseguimos saber se o rebanho se alimentou, se hidratou e se está ganhando peso de forma saudável. A partir do peso vivo, coletado diariamente, detectamos precocemente possíveis doenças e proporcionamos um atendimento rápido e efetivo, minimizando o sofrimento destes animais.
É muito difícil saber como será a demanda de carne daqui para frente, devido ao consumo estar muito atrelado à economia, mas afirmo que uma vez que os mercados interno e externo estão exigindo diferenciação em qualidade, rastreabilidade, origem e sustentabilidade de que o produto é o mais natural possível – vale lembrar que as carnes sintéticas precisarão passar por processos físicos e químicos para acelerarem o seu desenvolvimento, sendo rotuladas como industrializadas – a pecuária tradicional nunca deixará de existir.
Cada vez menos a proteína animal será vista como commoditie e mais como um produto de alto valor agregado. E está aí uma boa notícia: produtores que estiverem mais atentos às mudanças do mercado terão uma atividade altamente rentável, minimizando os impactos ambientais e as dores dos animais e construindo um sentimento mais humano na produção. Ainda dá tempo!
*Marcelo Ribas é médico veterinário e atualmente exerce a função de diretor executivo da Intergado, startup que desenvolve e disponibiliza soluções de pecuária de precisão que melhoram a qualidade da informação e maximizam os resultados financeiros dos clientes.