Criado em 1997 pelo Confaz – Conselho Nacional de Política Fazendário, o Convênio 100/97 reduz a base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na comercialização interestadual de insumos agropecuários em até 30% para fertilizantes e rações e em até 60% para defensivos agrícolas e sementes.
Desde o início, o Convênio vem sendo renovado periodicamente. Em maio de 2019, por exemplo, foi estendido por mais um ano e, em março de 2020, por oito meses, com prazo até 31 de dezembro de 2020. Neste momento, o Confaz estuda a renovação e, se não acontecer dentro do prazo, o Convênio será automaticamente revogado. Ainda este ano, há duas reuniões do Conselho agendadas: 29 de outubro e 9 de dezembro.
O momento é especial para o setor de fertilizantes, que, através do Sinprifert – Sindicato Nacional da Indústria de Matérias-Primas para Fertilizantes – vem trabalhando pela isonomia tributária entre produto nacional e importado, pois o primeiro vem subsidiando parcela substancial de fertilizantes vindos de outros países, dificultando investimentos do setor e a criação de novas plantas industriais.
Nesta entrevista exclusiva o GestAgro 360°, Bernardo Silva, diretor executivo do Sinprifert, fala sobre o tema e expõe as necessidades do setor, dos benefícios da isonomia para os produtores agrícolas, os Estados e toda a cadeia produtiva, incluindo setor de mineração e indústria química.
Confira abaixo. Boa leitura.
GestAgro 360° – Qual a leitura do Sinprifert sobre o Convênio 100/97, do Confaz?
Bernardo Silva – Esse convênio – que tem como objetivo auxiliar o produtor rural – institui benefício fiscal para insumos, sementes, fertilizantes e defensivos, sem distinção, com redução da base de cálculo do ICMS de 30% e de 60% de acordo com o tipo de insumo. No caso dos fertilizantes, é criada uma distorção, porque a Organização Mundial do Comércio – OMC – exige que produtos importados paguem a mesma alíquota do Estado para onde são destinados, independentemente do trajeto do porto de entrada no Brasil até o destino. Desse modo, o produto importado entra com 0% e os nacionais, devido às alíquotas interestaduais, pagam 4,9% ou 8,4% dependendo do produto e da base de cálculo, porque há uma alíquota zerada de ICMS interno e uma alíquota reduzida entre Estados. Isso reduz a competitividade do produto nacional, estagna a produção nacional e caiu nos últimos dois anos, como mostra o gráfico.
GA 360° – Qual o percentual do consumo nacional que é importado? Que riscos são derivados da importação?
BS – O Brasil é o maior importador de fertilizantes do mundo, comprando no mercado internacional 90% dos fertilizantes consumidos no País, sendo que o Brasil é ainda o 4º maior consumidor, reduzindo os riscos cambiais, políticos (os fornecedores são China, Rússia, Marrocos e Oriente Médio, entre outros países) e logísticos (pandemia afetou produção e transporte). Essa dependência do mercado internacional traz alguns problemas. Por exemplo, durante a pandemia do novo coronavírus, a China impediu que produtos estratégicos saíssem do país, o que poderia ter gerado, para o Brasil, uma quebra na cadeia. Isso só não aconteceu porque o suprimento para a safra atual já estava garantido.
GA 360° – Com um solo com tão variados elementos minerais, por que essa dependência do mercado externo é tão significativa?
BS – Temos no Brasil minerais disponíveis, como Fosfato e Potássio, que tornariam o País o 8°maior produtor do mundo. Além disso, o gás natural tem o potencial de trazer de quatro a cinco novas plantas de fertilizantes hidrogenados. No entanto, para os investimentos serem praticados, gerando retorno para os Estados, reduzindo a dependência de importações e beneficiando o próprio agronegócio brasileiro, dependemos de uma estrutura tributária mais eficiente. Hoje, 100% da produção nacional são usados no Brasil. O que desejamos é equilibrar melhor a proporção de importados e nacionais para diminuir a dependência de fornecedores internacionais.
GA 360° – Quais são as reivindicações do Sinprifert nesse tema?
BS – O Sinprifert reúne as empresas que produzem fertilizantes no Brasil. Por isso, considera ser fundamental e estratégico para o País a revisão do convênio 100/97 e a implementação de um regime tributário isonômico de ICMS para fertilizantes. A isonomia dará segurança ao suprimento nacional, o Brasil é o único país do mundo a subsidiar a importação de fertilizantes. Nossa sugestão é a de tributar internamente o ICMS em 4% e aplicar a mesma alíquota sobre de ICMS do produto importado. Ou seja, simplificar para que todos estejam no mesmo patamar, sem diferenciação, gerando uma estrutura mais eficiente para o setor.
O que queremos é uma revisão, não uma revogação nem restringir as importações. Desde que foi instituído, o convênio 100/97 nunca foi revisado. É necessário fazer ajustes, e para isso é preciso sensibilizar os Estados da existência de uma melhor alternativa e de alternativas para correção das distorções.
GA 360° – Como essas reivindicações do Sinprifert impactam o produtor agrícola brasileiro?
BS – Precisamos ter um olhar de médio prazo para que os benefícios sejam mais perceptíveis, mas uma vantagem inequívoca é que o setor de fertilizantes mais próximo do agricultor traz ganhos de escala, com consequente redução dos custos de transporte, ambiental e de combustível, com reflexos na pegada de carbono e nos CBios, por exemplo. O importante é que com essa solução de termos uma alíquota única todos ganham. O agro tem produção local mais eficiente, menor custo a médio e longo prazos, e o aumento de custo para o produtor rural é de 0,45% a 0,66% para soja, milho e algodão. Esses custos são neutralizados com facilidade pelo aumento da eficiência, além de se criar um ambiente equilibrado.
GA 360° – Quais os gargalos para o setor de fertilizantes ter a solicitação atendida pelo Confaz?
BS – Não podemos esquecer que há uma necessidade urgente de os Estados equilibrarem as contas. A produção nacional acaba subsidiando o importado. A dificuldade é que para ser aprovada, a extensão da validade do Convênio ICMS 100/97 depende de aprovação por unanimidade dos 26 Estados e do Distrito Federal, representados no Confaz pelos secretários de Fazenda, Planejamento ou Tributação.
GA 360° – A isonomia trará resultados positivos para os Estados?
BS – Se conseguirmos a isonomia desejada, os Estados ampliarão a receita, devido ao volume de importações que hoje não é tributado. Também serão favorecidos o desenvolvimento do setor e o investimento em novas plantas, assim como fortalecerá a indústria química e a mineração.
GA 360° – Quais os principais benefícios da isonomia tributária do ICMS dos fertilizantes?
BS – A médio e longo prazos, a isonomia trará uma série de benefícios para toda a cadeia produtiva e contribuirá para a retomada econômica pós-pandemia. Calcula-se que alguns Estados podem arrecadar mais de R$ 1 bilhão em ICMS anualmente com a medida. A isonomia tributária permitirá, por exemplo, que se materializem as oportunidades trazidas pelo novo Marco do Gás Natural – projetos das FAFENS (Nitrogenados). Há estimativas de que, no caso de a solução apresentada pelo Sinprifert ser acatada pelo Confaz, serão investidos cerca de US$ 13 bilhões em novas plantas, minas etc., aumento a produção na ordem de 10 milhões de toneladas/ano que é mais do que a produção atual de 7 milhões de toneladas/ano.