No período de 20 a 24 de outubro, Christophe Hansen, comissário Europeu para Agricultura e Alimentação, acompanhado por delegação empresarial agroalimentar da União Europeia (UE) com cerca de 80 produtores e organizações europeias do setor agroalimentar, participou de reuniões com produtores e organizações agroalimentares em São Paulo (SP) com a finalidade de dar andamento a projeto em elaboração há cerca de uma década.
A missão contou com representantes de diversas categorias, tais como produtos agrícolas processados (confeitaria, chocolate, massas, biscoitos), laticínios (com foco especial em queijos), carnes processadas, vinhos e destilados, cervejas, azeite de oliva, frutas e vegetais, bem como produtos reconhecidos com Indicações Geográficas (IG).
Ao longo dos quatro dias, a comitiva buscou conhecer o mercado brasileiro e realizou rodadas de negócios, além de visitar propriedades rurais e conhecer pontos de varejo como o Mercado Municipal de São Paulo, localizado no Parque Dom Pedro, na capital paulista.
No dia 23 de outubro, ocorreram os principais eventos da agenda em São Paulo (SP), reunindo o Comissário Hansen, a delegação europeia e representantes brasileiros do setor. O dia começou com reunião entre o secretário de Comércio e Relações Internacionais, Luís Rua, e o comissário europeu para Agricultura, Christophe Hansen, com a presença do diretor do Departamento de Negociações Não-Tarifárias e de Sustentabilidade do Mapa, Augusto Billi, da embaixadora da União Europeia no Brasil, Marian Schuegraf, e de representantes da Comissão Europeia.
A reunião deu continuidade às tratativas iniciadas durante a missão liderada pelo secretário à União Europeia no início de outubro e teve como foco principal os avanços concretos na pauta sanitária bilateral. O encontro marcou um novo capítulo na cooperação entre o Brasil e o bloco europeu, consolidando entendimentos sobre temas prioritários para o setor agropecuário de ambas as partes.
Entre os resultados alcançados, destacou-se o retorno do sistema de pre-listing de estabelecimentos habilitados a exportar carne de aves à União Europeia. O Brasil também atendeu a pleitos de interesse europeu relacionados ao acesso a mercados.
Múltiplas reuniões
As delegações discutiram diversos temas que seguirão em avanço, como a auditoria da UE para avaliação do sistema brasileiro de pescados, o pre-listing para estabelecimentos de ovos e carne bovina, o reconhecimento mútuo de produtos orgânicos, a regionalização de enfermidades, além da certificação eletrônica e da harmonização de certificações.
As partes reafirmaram o compromisso com a continuidade do diálogo e a busca por soluções recíprocas para pendências de interesse comum, reforçando a parceria estratégica entre o Brasil e a União Europeia. Ficou acordada a retomada de um mecanismo permanente de alto nível para tratar desses temas, com a próxima reunião prevista para o primeiro trimestre de 2026.
Também foram debatidas as oportunidades e benefícios para os agricultores brasileiros e europeus decorrentes da eventual conclusão do acordo Mercosul–União Europeia.
No saguão, foi montada uma exposição dos produtos dos integrantes da comitiva.
Missão empresarial
A manhã teve início com reunião da Missão Empresarial Agroalimentar da União Europeia, evento voltado à apresentação de oportunidades de negócios para empresários europeus e brasileiros, aberta em conjunto por Christophe Hansen e Luís Rua, secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). A parte da tarde foi marcada por rodada de negócios.
Em seu pronunciamento inicial, Hansen focou nos desenvolvimentos mais recentes dessas negociações, lembrando que “sublinham o quão essencial é oferecer aos operadores econômicos a estabilidade e a previsibilidade de que necessitam para aproveitar as oportunidades de intercâmbio, o cerne do seu trabalho. Em tempos de turbulência, é mais importante do que nunca estar ao lado de parceiros que pensam da mesma forma”.
Afirmando-se “convencido de que vocês e o Brasil são parceiros com afinidades que partilham uma forte parceria bilateral”, o comissário reforçou sua confiança na missão e no fórum como instrumentos que “abrem portas para os nossos exportadores estabelecerem novos contatos. Muitos de vocês já atuam aqui no Brasil, mas muitos também são novos neste país, para que possam explorar o potencial do mercado brasileiro para os nossos produtos agrofrutícolas, e também preparar o terreno para capitalizar as oportunidades mais fortes oferecidas pelo acordo UE-Mercosul.”
A meta sinalizada pelo comissário da União Europeia para o acordo com o Mercosul e a importância dessa união envolvem criar “uma comunidade de 700 milhões de pessoas que é de grande importância, não só em termos econômicos, com a criação de um grande mercado, mas também em termos geopolíticos, como a criação de um bloco de parceiros com afinidades que favorecem o multilateralismo, o intercâmbio aberto e a sustentabilidade, tudo baseado em regras. E sabemos que nem todas as grandes economias globais estão atualmente seguindo esse caminho.”
Encerrando sua fala, Hansen expressou sua felicidade em saber da importância que o Brasil dedica à indústria agrícola e às Indicações Geográficas, assim como à proteção contra o uso indevido de “produtos como o queijo Canastra ou a cachaça”, e frisou: “Esta missão é também uma oportunidade para discutir com os meus colegas brasileiros, para progredir nas questões de acesso ao mercado e para promover o potencial de mercado e o potencial inerente dos nossos fortes parceiros. Precisamos conectar os elos, como eu disse, com parceiros que partilham valores previsíveis e confiáveis. E acredito que isto é verdade em ambos os lados do Atlântico, aqui no Brasil, mas também na União Europeia.”
Parceiro de relevância
Luis Rua, secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), reafirmando o papel da União Europeia como “parceiro comercial de grande relevância, sendo o segundo principal destino de suas exportações, atrás apenas da China”.
Definindo o objetivo da visita da comitiva como o de “fortalecer os laços comerciais, que se estendem para além do comércio, englobando aspectos históricos, culturais e investimentos”, Rua frisou que “o Brasil tem manifestado publicamente seu interesse na assinatura do Acordo União Europeia-Mercosul”, Rua reconheceu “a existência de questões burocráticas e procedimentos legais a serem cumpridos, consideramos crucial o avanço nessa agenda.”
“A concretização do acordo, em especial neste momento, representa um sinal positivo para o mundo, reafirmando a importância do comércio, do investimento e do respeito mútuo. Sendo assim, acelerar a conclusão do acordo nos levará nessa direção, beneficiando um mercado de 700 milhões de pessoas e promovendo a consolidação de valores comuns”, disse, sinalizando o alinhamento do Mapa com a comissão europeia, inclusive “para promover o desenvolvimento do comércio de produtos europeus no Brasil e, consequentemente, facilitar a exportação de produtos brasileiros para a Europa.”
O recado final do secretário do Mapa fortaleceu a postura nacional de busca de equidade: “Aproveito esta oportunidade para solicitar aos produtores e exportadores europeus presentes que apoiem os esforços em prol do acordo, contribuindo para desmistificar informações equivocadas que possam prejudicar o processo, tanto no Mercosul quanto na União Europeia. O Brasil, como um país com grande potencial de consumo, oferece um mercado promissor para produtos europeus. Esperamos, por outro lado, tratamento igualitário e reconhecimento da qualidade e sanidade de nossos produtos, que já são exportados para a Europa com sucesso.”
A visão dos participantes
Secretário-geral da EDA – European Dairy Association (Associação Europeia de Laticínios), Alexander Anton vê “oportunidades de negócios e parcerias estratégicas muito claras que promovem as agendas de criação de produtos lácteos de valor agregado, sustentabilidade e rastreabilidade, e inovação dentro do mercado brasileiro. Aqui, nosso foco está tanto nos produtos lácteos importados (B2B e B2C, como queijo, manteiga, ingredientes de soro de leite) quanto no papel das empresas de laticínios europeias na transferência de tecnologias avançadas de processamento, capacidades de pesquisa e melhores práticas – aliás, um processo de mão dupla nesse meio tempo.”
Sua posição está baseada no que ele define como “longa integração de várias empresas de laticínios europeias na ‘lactosfera’ brasileira.” Essa colaboração – garante ele – ajuda a atender às necessidades de um mercado consumidor brasileiro “cada vez mais sofisticado, ao mesmo tempo em que apoia o fornecimento de produtos lácteos acessíveis e nutritivos para os consumidores na base da pirâmide no Brasil.”
A contrapartida para a agroindústria brasileira – assegura Anton – funda-se nas oportunidades e na conscientização “no mais alto nível político de ambos os lados sobre a importância de nosso relacionamento no setor de laticínios entre a UE e o Brasil. O Comissário da UE, Christophe Hansen, deixou bem claro em seus discursos em São Paulo: A União Europeia se orgulha de ser um parceiro confiável e seguro a nível internacional. E essa confiabilidade vai muito além das relações comerciais agroalimentares.”
Franz Xaver Ladenburger, CEO da Max Ladenburger Söhne Heimatsmühle GmbH & Co. KG, destacando a diversidade de indústrias e produtores da produção de alimentos na União Europeia presente na delegação, como são acompanhados “pelo nível político correspondente”, abrem, potencialmente, “múltiplas possibilidades de intercâmbio mútuo e de desenvolvimento concreto de relações comerciais. Idealmente, tais iniciativas resultam em um movimento de mercadorias em ambas as direções.”
Citando sua empresa como exemplo, Ladenburger informou que a estão trabalhando “intensamente com nosso parceiro brasileiro – também uma empresa familiar, a Aidu – para construir tal relacionamento mútuo no comércio de mercadorias nos próximos meses. Além da consideração puramente econômica, o aspecto de aprofundar o relacionamento entre pessoas de diferentes continentes é igualmente importante para mim.”
O empresário crê, também, que “a troca de experiência e o conhecimento fornecidos por ambos os lados em relação a diferentes áreas basicamente abrem a possibilidade de que um possa aprender com o outro, por exemplo, no que diz respeito a métodos de cultivo, processos de processamento existentes, conhecimento do produto e a variedade de aplicações. Isso além dos aspectos de eficiência e gestão com economia de recursos. Também aqui, a possível transferência de experiência e know-how não é uma via de mão única.”
“O aprofundamento desejado do relacionamento entre os Estados Membros do Mercosul e a União Europeia que melhora e facilita, pelo menos, a possibilidade de entrada mútua no mercado. A decisão final, no entanto, é tomada pelo consumidor. Tal abertura, se o comércio em pé de igualdade for viabilizado, é contrária ao isolamento por tarifas arbitrárias”, assegura Ladenburger.
A conexão entre os mercados europeus e do Mercosul resultante da migração histórica, para Markus Suttle, diretor de Relacionamentos da Intrepid Spirits é fortalecida pelo fato de a Irlanda – país de origem da empresa – ter “uma população brasileira significativa que hoje aproxima os mercados mais do que nunca. A missão reúne representantes da indústria e produtores com seus homólogos brasileiros, construindo uma plataforma para colaboração. Missões comerciais diferem de uma visita de mercado tradicional, pois são uma oportunidade de aprender e desenvolver juntos, em oposição a apenas uma visita de vendas comum. A missão traz um grupo amplo de pessoas de todas as indústrias agroalimentares para introduzir novos produtos e ideias e construir relacionamentos mutuamente benéficos.”
Outro ponto positivo alinhado por Suttle é visitar e experienciar os mercados uns dos outros. A iniciativa, para ele, de experienciar as diferenças, tanto positivas quanto negativas, em primeira mão, é a melhor maneira de compartilhar ideias e fomentar relacionamentos. “Esses aprendizados nos permitem focar no que é adequado para os mercados de cada um e aconselhar as mudanças ou adaptações necessárias para ser bem-sucedido em cada mercado”, reforça, garantindo que “tanto a Europa quanto o Brasil têm demanda por produtos de qualidade e ambos podem produzir produtos de qualidade.”
O diretor de Relacionamentos da Intrepid Spirits também alinha como condição de mercado ideal “política tributária clara, justa e consistente, que não penalize o consumidor e garanta valor e escolha. “Isso deve funcionar nos dois sentidos, beneficiando o consumidor brasileiro e o europeu. À medida que expandimos nossos negócios na Intrepid Spirits, queremos focar em mercados que sejam confiáveis e consistentes para permitir planejamento e foco de longo prazo, e espero que o mesmo aconteça com as empresas do agronegócio brasileiro que exploram suas oportunidades de exportação, que podem ver a UE como um parceiro justo e confiável”, resumiu.
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